Processo Extraordinário de Viabilização de Empresas

No dia 27 de novembro de 2020 foi publicada a Lei N.º 75/2020, que estabelece o Processo Extraordinário de Viabilização de Empresas (PEVE) afetadas pelos efeitos da pandemia COVID-19.

Este diploma, além de criar o aludido plano, apresenta ainda novidades no âmbito do Processo de Insolvência, do Processo Especial de Revitalização (PER) e do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE).

O PEVE consiste num regime excecional e temporário de prorrogação do prazo para conclusão das negociações encetadas com vista à aprovação de plano de recuperação ou de acordo de pagamento, bem como de concessão de prazo para adaptação da proposta de plano de insolvência, no âmbito da pandemia COVID-19, destinando-se às empresas que, comprovadamente, se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente ou atual devido à pandemia, sendo, no entanto, ainda suscetíveis de viabilização.

Este processo pode ser utilizado por qualquer empresa que cumpra os seguintes requisitos:

  • Não tenha pendente PER ou processo especial para acordo de pagamento à data da apresentação do requerimento;
  • Reúna as condições necessárias para a sua viabilização; e
  • Demonstre ter, em 31 de dezembro de 2020, um ativo superior ao passivo.

O PEVE pode ainda ser requerido por micro ou pequena empresa que não tivesse, em 31 de dezembro de 2020, um ativo superior ao passivo, desde que:

  • Não tenha pendente processo de insolvência, processo especial de revitalização ou processo especial para acordo de pagamento à data da apresentação do requerimento;
  • Tenha recebido um auxílio de emergência no âmbito do quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal em apoio da economia no atual contexto da pandemia da doença COVID-19 e o mesmo não tenha sido reembolsado nos termos legais; ou
  • Esteja abrangida por um plano de reestruturação no quadro das medidas de auxílio estatal.

Por fim, o PEVE pode ainda ser utilizado por empresas que, não tendo a 31 de dezembro de 2020, um ativo superior ao passivo, tenham logrado regularizar a sua situação com recurso à disposição transitória prevista no n.º 1 do artigo 35.º do RERE, isto é, no prazo de 18 meses desde a entrada em vigor que aprovou o RERE, com dispensa da apresentação da declaração que atesta que a empresa não se encontra em insolvência, desde que tenham procedido ao depósito tempestivo do acordo de reestruturação.

O PERE assume carácter de urgência, inclusivamente nas eventuais fases de recurso, assumindo prioridade sobre a tramitação e julgamento de processo de insolvência, de processo especial de revitalização e de processo especial para acordo de pagamento.

TRAMITAÇÃO DO PROCESSO

O PEVE inicia-se pela apresentação pela empresa, no tribunal competente para declarar a sua insolvência, de requerimento acompanhado dos seguintes elementos:

  • Declaração escrita e assinada pelo órgão de administração da empresa que ateste que a situação em que se encontra é devida à pandemia da doença COVID-19 e que reúne as condições necessárias para a sua viabilização;
  • Cópia dos documentos a que aludem as alíneas b) a i) do n.º 1 do artigo 24.º do CIRE, nomeadamente:
    1. Relação e identificação de todas as ações e execuções que contra si estejam pendentes;
    2. Documento em que se explicita a atividade ou atividades a que se tenha dedicado nos últimos três anos e os estabelecimentos de que seja titular, bem como o que entenda serem as causas da situação em que se encontra;
    3. Documento em que identifica o autor da sucessão, tratando-se de herança jacente, os sócios, associados ou membros conhecidos da pessoa coletiva, se for o caso, e, nas restantes hipóteses em que a insolvência não respeite a pessoa singular, aqueles que legalmente respondam pelos créditos sobre a insolvência;
    4. Relação de bens que o devedor detenha em regime de arrendamento, aluguer ou locação financeira ou venda com reserva de propriedade, e de todos os demais bens e direitos de que seja titular, com indicação da sua natureza, lugar em que se encontrem, dados de identificação registal, se for o caso, valor de aquisição e estimativa do seu valor atual;
    5. Tendo o devedor contabilidade organizada, as contas anuais relativas aos três últimos exercícios, bem como os respetivos relatórios de gestão, de fiscalização e de auditoria, pareceres do órgão de fiscalização e documentos de certificação legal, se forem obrigatórios ou existirem, e informação sobre as alterações mais significativas do património ocorridas posteriormente à data a que se reportam as últimas contas e sobre as operações que, pela sua natureza, objeto ou dimensão extravasem da atividade corrente do devedor;
    6. Tratando-se de sociedade compreendida em consolidação de contas, relatórios consolidados de gestão, contas anuais consolidadas e demais documentos de prestação de contas respeitantes aos três últimos exercícios, bem como os respetivos relatórios de fiscalização e de auditoria, pareceres do órgão de fiscalização, documentos de certificação legal e relatório das operações intra grupo realizadas durante o mesmo período;
    7. Relatórios e contas especiais e informações trimestrais e semestrais, em base individual e consolidada, reportados a datas posteriores à do termo do último exercício a cuja elaboração a sociedade devedora esteja obrigada nos termos do Código dos Valores Mobiliários e dos Regulamentos da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários;
    8. Mapa de pessoal que o devedor tenha ao serviço.
  • Relação por ordem alfabética de todos os credores, incluindo condicionais, com indicação dos respetivos domicílios, dos montantes dos seus créditos, datas de vencimento, natureza e garantias de que beneficiem, e da eventual existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), subscrita e datada, há não mais de 30 dias, pelo órgão de administração da empresa e por contabilista certificado ou por revisor oficial de contas, sempre que a revisão de contas seja legalmente exigida;
  • Acordo de viabilização, assinado pela empresa e por credores que representem pelo menos as maiorias de votos previstas no n.º 5 do artigo 17.º-F do CIRE.

Mediante a apresentação do requerimento, a empresa pode requerer a apensação do PEVE, intentado por sociedades comerciais com as quais a empresa se encontre em relação de domínio ou de grupo, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, quando este, encontrando-se igualmente na fase liminar, tenha sido instaurado ao abrigo do presente regime. Após a receção do pedido, o juiz nomeia de imediato, por despacho, o administrador judicial provisório, devendo a secretaria publicar na Área de Serviços Digitais dos Tribunais a relação de credores e o acordo de viabilização e a empresa é imediatamente notificada deste despacho.

Os credores dispõem do prazo de 15 dias, contados da publicação da relação de credores na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, para proceder à sua impugnação junto do tribunal competente, com fundamento na indevida inclusão ou exclusão de créditos ou na incorreção do montante ou da qualificação dos créditos reconhecidos, e solicitar a não homologação do acordo de viabilização.

Por fim, qualquer credor que não conste da relação de credores definitiva goza do prazo de 30 dias, contados da publicitação da decisão de homologação do acordo de viabilização na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, para, por mera declaração, manifestar no processo a sua intenção de aderir ao acordo homologado.

Este processo é isento de custas processuais.

EFEITOS

A decisão supra aludida tem os seguintes efeitos:

  • Impedimento de instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra a empresa e, até ao trânsito em julgado da sentença de homologação ou de não homologação, suspensão, quanto à empresa, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se as mesmas logo que seja homologado o acordo de viabilização, salvo quando este preveja a sua continuação ou quando os créditos em causa naquelas ações não estejam abrangidos pelo acordo;
  • Impedimento da empresa de praticar atos de especial relevo, sem que previamente obtenha autorização para a realização da operação pretendida por parte do administrador judicial provisório;
  • Suspensão dos processos de insolvência em que anteriormente haja sido requerida a insolvência da empresa na data de publicação do despacho na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, desde que não tenha sido proferida sentença declaratória da insolvência, extinguindo-se logo que seja homologado o acordo de viabilização;
  • Suspensão dos processos de insolvência em que seja requerida a insolvência da empresa que tenham entrado após a publicação do despacho na Área de Serviços Digitais dos Tribunais;
  • Manutenção das garantias convencionadas entre a empresa e os seus credores no âmbito do PERE, com a finalidade de proporcionar àquela os necessários meios financeiros para o desenvolvimento da sua atividade, ainda que, findo o processo, venha a ser declarada, no prazo de dois anos, a sua insolvência;
  • Gozo de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes do privilégio creditório mobiliário geral concedido aos trabalhadores, pelos credores, sócios, acionistas ou quaisquer outras pessoas especialmente relacionadas com o devedor que, no âmbito do PERE, financiem a atividade da empresa disponibilizando-lhe capital para a sua viabilização;
  • Na eventual declaração de insolvência da empresa, tornam-se insuscetíveis de resolução em benefício da massa insolvente os negócios jurídicos que hajam compreendido a efetiva disponibilização à empresa de novos créditos pecuniários, incluindo sob a forma de diferimento de pagamento, e a constituição, por esta, de garantias respeitantes a tais créditos pecuniários, desde que os negócios jurídicos hajam sido expressamente previstos no acordo de viabilização;
  • Indisponibilidade dos créditos tributários e da Segurança Social, só podendo existir redução da taxa de juros de mora, no âmbito de acordo homologado conducente à consolidação financeira da empresa;
  • A homologação do acordo de viabilização confere ainda às partes subscritoras os benefícios fiscais no âmbito de imposto sobre o rendimento, imposto do selo e imposto sobre a transmissão onerosa de imóveis, desde que compreenda a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado da empresa.

OUTRAS MEDIDAS ADOTADAS

Por fim, destacamos outras medidas incluídas no diploma em apreço, que passamos a enumerar:

  • Obrigação da realização de rateios parciais das quantias depositadas à ordem da massa insolvente todos os processos de insolvência pendentes à data da entrada em vigor do presente diploma, desde que se verifique, cumulativamente:
    1. O trânsito em julgado a sentença declaratória da insolvência e o processo tenha prosseguido para liquidação do ativo;
    2. O término do prazo de impugnação da relação de credores, sem que nenhuma impugnação tenha sido deduzida, ou, tendo-o sido, se a impugnação em causa já estiver decidida;
    3. As quantias depositadas à ordem da massa insolvente sejam iguais ou superiores a EUR 10.000,00 e a respetiva titularidade não seja controvertida.
  • Priorização dos requerimentos de liberação de cauções ou garantias prestadas no âmbito de processo de insolvência, processo especial de revitalização e processo especial para acordo de pagamento, apresentados em processos novos e nos que estejam pendentes à data da entrada em vigor da lei em apreço, sobre os demais requerimentos apresentados no âmbito desses processos.

A Lei N.º 75/2020 entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, vigorando até 31 de dezembro de 2021, sem prejuízo de eventual prorrogação por decreto-lei.

A TFRA manter-se-á atenta e atualizará a informação deste flash sempre que se justificar.

Por fim, alertamos que a informação constante deste documento é de carácter genérico e não dispensa, por isso, a análise do caso concreto, nem a consulta da documentação oficial e legislação em vigor a cada momento.

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